Se você é do setor de telecomunicações, certamente já ouviu falar sobre a Declaração Multissetorial de São Paulo, mais conhecida como “Declaração da NETmundial”, seja porque ela se originou de evento que foi um marco no cenário nacional e internacional, seja por ter sido a ocasião na qual, a então presidente do Brasil, Dilma Roussef, sancionou a Lei do Marco Civil da Internet.
Na época, o Brasil já vinha caminhando para a elaboração de uma Lei que regulasse princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no país, caminho que foi acelerado após as declarações feitas em 2013, por Edward Joseph Snowden – ex-administrador de sistemas da CIA, o qual revelou ao mundo o poderio da espionagem norte-americana.
Assim, o então projeto de Lei que, posteriormente, tornou-se o Marco Civil da Internet, passou a tramitar em regime de urgência constitucional na Câmara dos Deputados. Posteriormente, foi aprovado no Congresso Nacional e sancionado em 3 de abril de 2014, durante a abertura do Encontro Global Multissetorial sobre o Futuro da Governança da Internet – NETMundial, em São Paulo.
Em verdade, ainda hoje muito do que foi discutido naquela ocasião é colocado em pauta quando falamos de regulação aplicável ao setor de telecomunicações e tecnologia no geral, seja em relação à liberdade de expressão, privacidade, acessibilidade e afins.
Ademais, é importante destacar que o Encontro, à época, “foi convocado para discutir dois aspectos importantes para a evolução futura da Internet, de uma forma aberta e multissetorial: 1. Princípios da Governança da Internet, e 2. Roteiro para a evolução futura do Ecossistema de Governança da Internet”.
Neste cenário, recentemente, o Comitê Gestor da Internet (CGI.br) anunciou a “proposta de realizar, em 2024, um evento multissetorial – fora dos espaços institucionais – para reunir a comunidade internacional e contribuir para os debates em curso”, logo, um NETmundial+10. Ainda, junto à proposta, o CGI.br denotou a importância de resgatar os princípios acordados em 2014, bem como atualizar as discussões sobre governança da Internet e o ecossistema digital.
Vale ainda dizer que o Comitê afirmou que “a liderança do Brasil poderia funcionar como um catalisador do processo, como o fez em 2014, principalmente tendo em vista o reconhecimento do país como importante líder do sul global no campo e no momento em que o Brasil estará na presidência do G20”.
Assim sendo, o CGI.br citou possíveis desdobramentos e resultados a serem perseguidos:
“1. Revisar, renovar e consolidar acordos estabelecidos no NETmundial, sobre os princípios da governança da Internet, bem como atualizar a agenda estratégica comum; ”
“2. Debater o papel do multissetorialismo na governança da Internet e nos espaços de debates nacionais e internacionais, em colaboração com espaços multilaterais de decisão.”
“3. Uma revisão da Declaração de São Paulo e do Roadmap propostos em 2014, à luz das profundas transformações do ecossistema digital, que ressalte a relevância social, cultural e econômica da Internet e suas aplicações como instrumentos de promoção do desenvolvimento e da cidadania”.
Assim, a partir da proposta feita pelo CGI.br, é possível detonar que: o Brasil busca novamente um papel de liderança no sul global, bem como tende a ampliar e renovar o debate já feito na NETmundial.
No entanto, como isso afeta o setor de telecomunicações?
Em verdade, a partir de tudo que já foi dito, bem como partindo da experiência já vivenciada na NETmundial em 2014, tem-se como um cenário propício para ampliação de debates sobre novas/renovações de regulações ao setor de telecomunicações, seja em relação ao que já temos, seja em relação aos novos debates que surgiram deste o último evento.
Dois pontos que, possivelmente, serão debatidos, referem-se à Inteligência Artificial e à responsabilidade de provedores sobre conteúdos produzidos por terceiros, tópicos que, embora já existentes em 2014, tiveram foco ampliado nos últimos anos.
Ainda, o fato de o Brasil assumir novamente o protagonismo no sul global pode ampliar e acelerar os debates de regulações que tramitam no Congresso Nacional, como ocorre com o PL 2630/20 – também conhecido como PL das Fake News, tendo em vista que seria novamente um marco legislativo no país.
Assim, ficamos no aguardo do evento que possui data prévia no primeiro semestre de 2024, bem como destacamos a importância de o setor participar ativamente dos debates que o afetarão diretamente.
BIBLIOGRAFIA:
BRASIL, Comitê Gestor da Internet no. NETmundial+10: desafios globais para a governança do mundo digital. Desafios Globais para a governança do mundo digital. 2023. Disponível em: https://cgi.br/noticia/notas/netmundial-10-desafios-globais-para-a-governanca-do-mundo-digital/. Acesso em: 28 nov. 2023.
BR, Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto. NETmundial: declaração multisetorial. São Paulo: Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2014. Disponível em: https://cgi.br/media/docs/publicacoes/1/16570020190607-CadernosCGIbr_DeclaracaoNETmundial.pdf. Acesso em: 28 nov. 2023.
Dra. Anna Gardemann / Dra. Larissa Guidorizi de Barros / Dra. Mariana Vidotti – Juntas compõem o corpo de Advogados da Gardemann & Vidotti Advogados Associados